sábado, 20 de fevereiro de 2010

Morar na Barra pode ser simples e gostoso, como café com pão

O post de um leitor que ressaltava as maravilhas da Barra da Tijuca provocou muitos comentários na última semana. Muitos internautas concordaram com as beleza citadas, mas a maioria deles criticou o bairro por seus problemas (clique aqui e leia todos os comentários enviados). A leitora Gisele Brandão escreveu para o Opinião do Bairros.com para comentar umas dessas críticas. Leia abaixo:

Comentário publicado no Jornal de Bairro Barra, do Globo:

“Os moradores da Barra devem ter obrigação de afundar seus carros nos buracos da Avenida das Américas...Obrigação de ser assaltados em frente ao Cittá América..Obrigação de terem que ir ao shopping para comprar um pão, afinal, lá na Barra não tem padaria, só mercado...Obrigação de gastarem muito mais do que o resto dos cariocas, pois lá tudo é mais caro...Obrigação de viverem a vida inteira em uma “jaula”, afinal viver em condomínios da Barra é viver atrás das grades...Obrigação de ter que aturar playboys espancadores de empregadas e tentar, a todo custo, evitar que seu filho se torne um deles”. July Clarck

Pânico. Foi este o sentimento que tomou conta de mim após a leitura. De onde vim? Para onde vou? Por onde tenho andado? Quem sabe numa quarta dimensão? Passei a desconfiar de tudo e de todos. Teria sido eu abduzida, estarei em outra galáxia? Ou serei apenas um personagem kafkaniano? Sim, meus vizinhos me enganam. Eles fingem ter uma vida normal, saem de casa para passear seus cachorrinhos pela manhã, levar os filhos à escola, nossa... eles trabalham! Pagam impostos, reclamam da conta de luz e da taxa extra de condomínio. Cínicos é o que são! Voltam para casa carregados de sacolas de supermercado – Extra, Carrefour, Mundial, alguns com o encarte de ofertas do Prezunic ou Guanabara embaixo do braço, felizes com a cobertura do preço pelo mercado concorrente... mentirosos!

Segunda-feira é o dia em que todos se atrasam aqui em casa. Saio cedo, correndo contra o relógio, sem café da manhã. Quem me conhece sabe que esta é minha refeição favorita e que não abro mão do suco de laranja, frutas, queijos e pãezinhos, consumidos sem pressa enquanto leio o jornal. Hábito prejudicado às segundas, mas de mau humor é que não vou ficar: após deixar meu filho no colégio e respirar aliviada, paro na Padaria da Praça do Pomar.

Dos prazeres simples da vida, não há brasileiro que não se renda a um bom “café com pão”. O ambiente perfumado pelo café fresco matinal e o pãozinho francês crocante e quentinho (daqueles que derretem a manteiga): taí a dobradinha que deixa qualquer um pronto para um novo dia. A padaria do Jardim Oceânico é concorrida, alguns conhecidos me cumprimentam.. eu só não sabia que tudo fazia parte apenas da minha imaginação.

Sigo para o trabalho na Zona Sul. Pela orla é mais bonito. Procuro olhar para o mar e evitar o lado contrário: prédios de luxo gradeados. Incomoda não conseguir me livrar destas imagens... tudo miragem! Prédios e grades só existem na Barra!

Tento esquecer a sensação de medo ao cruzar Copacabana. Afinal, o assalto que sofri num sinal quando, ao ter uma arma encostada na cabeça, me levaram o carro em plena luz do dia, foi apenas um sonho!

Procuro também deletar da memória a notícia recente sobre o assalto a um prédio do Recreio praticado por jovens de classe média alta, moradores do Bairro Peixoto. O que me remete a outro fato: a morte no ano passado de André Luiz de Medeiros, 18 anos, classe média, traficante de drogas, morador também do Bairro Peixoto, morto pela explosão de uma granada que tentava arremessar contra a polícia do 19º BPM. Tudo mentira da imprensa! Pitboys só na Barra!!!!!

Aliás, por falar em mentira da imprensa, Ancelmo Góis publicou em sua coluna uma conta da Pizzaria Forneria, em Ipanema, conta esta que inclui o estacionamento do cliente – R$ 8 – e a taxa de serviço de 12%. O cliente pagou também R$ 4 por um guaraná diet (mais caro que uma garrafa de 2 litros) e R$ 4 por um café! Como é possível se paguei R$ 1,70 por um café na padaria da Barra?

Peço desculpas pelo desabafo, mas é que estou mesmo assustada com minhas alucinações. Tanto que fotografei o moço ao lado. Ele passa todas as manhãs pelas ruas aqui do bairro e, com sua buzina, anuncia o pão francês, o brioche, o pãozinho doce... Um entregador de pão e sua bicicleta. Eu, na janela, observando o povo passar...


(Matéria publicada no jornal O Globo, em 09 de maio 2008, com um trecho sobre mim e uma foto minha tirada pela autora do texto. A matéria original está disponível em http://oglobo.globo.com/rio/bairros/posts/2008/05/09/morar-na-barra-pode-ser-simples-gostoso-como-cafe-com-pao-101450.asp)

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